Escrito pelo Prof° Jefferson Rodrigues - Procurador do Ministério Público do Trabalho
Imagine que em frente ao estabelecimento de sua empresa existe um restaurante.
E neste restaurante são servidos, para todos os trabalhadores da empresa, arroz, feijão, uma boa proteína, salada e alguns complementos.
Todos os trabalhadores da empresa têm o direito de se alimentarem livremente no restaurante e assim o fazem, todos os dias.
Porém, somente aqueles que se filiaram ao restaurante têm a obrigação de pagar a conta das refeições servidas. E de todos os demais que consomem e não querem se filiar…
Se você fosse um dos filiados do restaurante e pagasse, mensalmente, o que é servido a você e aos demais consumidores não filiados, acharia isso correto?
Acharia justo pagar a conta daqueles que se alimentam às suas custas e nada contribuem?
É de se imaginar que a sua resposta seja negativa…
Mas saiba que é com essa contradição que os trabalhadores convivem no sistema sindical brasileiro.
O restaurante representa o sindicato.
E no cardápio, servido todos os dias, aos trabalhadores da categoria, independente da filiação ao sindicato, estão os direitos negociados coletivamente e previstos nos acordos e nas convenções coletivas de trabalho (as normas coletivas).
Existem um leque de direitos que os sindicatos conquistam nas negociações coletivas e muitos trabalhadores sequer sabem disso.
Acham que o patrão vai lá e entrega tudo de bandeja…
Participação nos lucros, vale-alimentação, vale-creche, plano de saúde e aumento salarial são só alguns exemplos que resultam da luta cotidiana dos sindicatos.
De acordo com a Constituição de 1988, o sindicato representa uma coletividade chamada de categoria e não somente associados.
A representação sindical advém de uma relação de fato e que é o enquadramento sindical, ou seja, o simples fato de você trabalhar em determinada atividade econômica.
A contribuição assistencial, prevista em norma coletiva, é deliberada, antes, pelo coletivo de trabalhadores em assembleia, num claro exercício prático da liberdade sindical.
O sindicato tem a missão, a obrigação, o dever e também o custo de representar uma categoria inteira.
Advogados, contadores, negociadores, empregados, imóveis, móveis, automóveis, enfim, é preciso ter a grandeza de reconhecer a necessidade de recursos para se materializar a atividade sindical.
É curioso, mas jamais se reclamou do fato de as cláusulas instituídas em normas coletivas afetarem o patrimônio jurídico dos integrantes da categoria, independente da filiação ao sindicato, exceto numa hipótese: a contribuição assistencial.
A norma coletiva pode até reduzir o salário do trabalhador (art. 7º, XI da CF/88) em benefício do patrão, mas se for prevista uma cláusula cobrando R$30,00 para fortalecer a luta coletiva dos próprios trabalhadores, lá vêm as pedras na mão contra os sindicatos.
A ideia de que os sindicatos deveriam viver, exclusivamente, da mensalidade de associados dá guarita ao enriquecimento ilícito e à mesquinhez daquele que pretende se alimentar da colheita sem contribuir, ao menos em parte, para a plantação.
Por não dizer respeito à atividade do sindicato enquanto pessoa jurídica e tampouco à matéria de cunho associativo, a cobrança do não filiado em nada viola o direito de não associação.
Goste ou não desse modelo negocial sindical é ele que está previsto na Constituição de 1988 e deve ser observado.
Aliás, é esse modelo sindical que garante cobertura de negociação coletiva a todos, inclusive daquele trabalhador que só reclama, não participa e tampouco paga, mas continua se alimentando no restaurante que é custeado pelos filiados, não por ele.
A contribuição assistencial não significa reviver a extinta contribuição sindical obrigatória.
A norma coletiva na qual se prevê a contribuição assistencial traz, no conjunto, um leque de direitos para os trabalhadores. Para todos!
Nem mesmo na ilha da fantasia existe um direito de receber o bônus sem qualquer contraprestação.
Portanto, é juridicamente correto os integrantes da categoria, que se beneficiam da atuação sindical, pagarem a contribuição assistencial.
O STF ao rever a Tese de Repercussão Geral nº 935 repara, em parte, um erro histórico na compreensão dessa importante questão jurídica e também social.
Diz-se em parte, pois, de forma contraditória, condiciona à previsão do “direito de oposição”.
Esse tal “direito de oposição”, na prática, significa que aquele trabalhador que, antes, sequer poderia ser cobrado, agora ele pode ser cobrado, mas tem o “direito” de chegar junto ao caixa do restaurante e dizer: “não quero pagar a minha parte da conta!”
Será que existe mesmo um “direito de oposição”?
E num sistema de normas coletivas que se aplica, com direitos e deveres, indistintamente, quanto aos integrantes da categoria?
Eu gostaria muito de falar sobre isso com você…
Mas num próximo artigo!
Até lá!